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Gestão e liderança de Produtos

A incorporação e adaptação da gestão de Produtos nas empresas

Uma introdução sobre os desafios da criação e implementação de times de gestão de produto nas empresa.

Diego Eis

As organizações frequentemente passam por três fases distintas de aceitação da gestão de produtos:

  1. Pré-gestão de produtos;
  2. Introdução da gestão de produtos;
  3. Expansão da gestão de produtos.

Podemos dizer que uma primeira etapa é quando nenhuma função de gestão de produtos foi criada oficialmente, e nesse momento um dos fundadores ou membro sênior da equipe técnica assume o papel de gestão de produto.

Isso é comum até hoje. Muitos fundadores fazem o papel de tecnologia e produto durante um tempo. Outros dividem esse papel desde o dia 1, onde alguém com visão de negócio e operação direciona decisões que seriam comuns numa área de produtos, enquanto outro cuida da parte totalmente técnica.

O segundo passo é quando há um reconhecimento de que o papel de gestão de produtos poderia ser uma ocupação específica. Um cargo relacionado ao produto é então incluído na equipe, às vezes como parte de alguma área (marketing, operações, estratégia... depende muito da empresa), outras vezes associado à área de tecnologia (mais comum). O importante é ter alguém que ajude o time a priorizar o que é certo.

O terceiro passo é quando a organização já tem algo construído, as vezes já até no mercado, mas agora precisa partir para a ampliação da área de produto e também a evolução desse produto. Aqui muda bastante de empresa para empresa. Pode ser decidido partir envolvendo uma posição com um papel de alto nível com assento na mesa executiva ou até mesmo tendo uma gerência média reportando para um dos executivos.

Antes de tudo, começando do começo

Antes de assumir o papel de gestão de produtos, existem certas tarefas e atividades que precisam ser concluídas pela empresa e outros times. É um processo de maturidade que toda empresa precisa avançar.

Podemos dizer que em uma fase pré-gestão de produtos, a liderança, geralmente o fundador da empresa ou um executivo-chave, toma decisões sobre onde concentrar seus recursos. Nesse momento, a empresa pode ter investimento externo ou é totalmente bootstrapped. Tanto faz.

É um cenário onde a engenharia é direcionada a criar novos conceitos de produtos, enquanto os departamentos de marketing e vendas são orientados a se concentrar em novas áreas de mercado.

Esse momento é interessante... É um desafio para empreendedores saber se contratam primeiro devs ou PMs? Contratam primeiro Designers ou Devs? Contratam Devs e Designers para executarem a primeira versão e depois corre atrás para escalar a gestão, dado que a priorização vem de você, como fundador ou senior? Quando é a hora de "profissionalizar" a liderança de produto?

Minha visão, tendo sido empreendedor, é de que natural e o mais certo, é que outros times nascem antes do que a gestão de produto, exatamente por que são mais requisitados para que a empresa tome forma e comece a rodar. Você precisa de uma marca e um nome no início, daí vem marketing com branding. Você precisa fechar negócios e criar relacionamento no mercado, dai vem o time de vendas e atendimento. Muitas vezes você precisa ter um pedaço de software rodando para conseguir entrar no mercado ou pegar um investimento, logo, você precisa de uma área de tech.

No início são fundadores e líderes iniciais

No início, fundadores e CEOs podem se beneficiar ao adotar uma mentalidade de gestão de produtos, o que envolve avaliar regularmente as prioridades e verificar a demanda de mercado antes de se comprometer com uma decisão. Essa abordagem exige a definição de planos, discussão com outras pessoas e manter-se atualizado. Uma forma organizada de pensar ajuda a garantir que a estratégia do produto esteja em harmonia em toda a empresa.

A não ser que haja fundadores bem inteligentes consigam separar de forma muito eficiente seu tempo entre expandir o negócio e a execução operacional, não acho que fundadores devem ficar muito tempo focados em produto. Nesse caso, sugeriria encontrar alguém que consiga direcionar melhor o time num slot de tempo maior, e aí os fundadores garantem alinhamento para direcionar decisões.

Nesse caso a pessoa de produto não precisa ser um líder oficial, mas talvez um PM muito senior e que tenha habilidade para lidar com fundadores é suficiente para segurar até a próxima fase de transformação da empresa.

A Gestão de Produtos é uma disciplina que ainda está ganhando reconhecimento no Brasil (no mundo eu acho que já está sendo bastante debatido a validade desse papel de forma integral), mas devido à importância desse papel na criação e priorização de gestão de produtos bem-sucedidos, ainda é uma disciplina importante.

É um campo multifacetado que requer conhecimentos em diversas áreas, como estratégia de produto, desenvolvimento, experiência do usuário, atendimento ao cliente e marketing. Isso não quer dizer a pessoa de produto é alguém especialista e que resolve os problemas dessas áreas. Mas com certeza é alguém que consegue entender como essas outras áreas de atuação são utilizadas pela empresa para potencializar o produto e o serviço.

Regras do hypergrowth

Em algumas empresas, a gestão de produtos nunca é formalizada além da fase de pré-gestão de produtos, mas muitas entendem o valor de fazê-lo para o sucesso a longo prazo. Eu não consigo medir o que pode ser uma fase de pré-gestão de produtos. Não acho que seja prudente medir isso baseado na receita. Mas entendo que um bom medidor seria no crescimento e no alcance que o Produto está tendo no mercado depois do seu lançamento ou até mesmo antes do lançamento, por meio das campanhas de marca e marketing.

Um produto que consegue chamar bastante atenção, seja do público ou dos investidores, vai precisar evoluir muito rápido para que possa potencializar camadas cada vez mais altas de growth. Hypergrowth é o sonho de toda startup e toda empresa de tecnologia.

Há uma regra de 4 passos que o Alexander V. Izosimov sugere sobre as fases de empresas hypergrowth:

  1. Foque primeiro em vendas. Aqui não é só focar em contratar vendedores... mas em como o produto é adquirido pelos clientes e pelas empresas. Vender não é só o ato de receber a grana dos clientes, mas também todo o processo antes e depois disso.
  2. Inove com cautela. Você já deve estar inovando o mercado abrindo a sua empresa com uma forma de entregar a proposta de valor diferente do resto. Calma. Foque-se em como deixar isso sustentável e escalável. Daí o próximo passo;
  3. Padronize estruturas e processos. Já trabalhei com diretores que não entendiam sobre estrutura matricial de empresa. Já trabalhei em empresas que se focavam agressivamente no crescimento, que se esqueceram de se adequar às regulações do governo. Entender como a empresa precisa ser "montada" para manter e escalar sua operação é essencial. O limite da escala que o Produto pode alcançar é o limite da capacidade da empresa organizar a sua própria casa;
  4. Delegue. Esqueça... você nunca vai conseguir fazer tudo sozinho. Tendo alguns sócios bem intencionados e inteligentes, você consegue ir longe... mas não vão conseguir chegar no infinito se não contratarem pessoas mais experientes, especialistas ou inteligentes. Os fundadores e executivos precisam escalar o impacto das suas decisões e a única forma de fazer isso é delegando.

Quem nomear?

Essa decisão vai depender muito do momento da empresa. Mas vamos imaginar que a empresa tem uma área estabelecida de produto, mas ainda com report para um dos fundadores. Ou seja, não há um líder oficial, com autonomia para estruturar e planejar próximos passos.

Nesse caso, as organizações podem optar por duas opções possíveis: nomear alguém senior que já está no negócio e tem capacidade suficiente para fazer a área acompanhar o crescimento da empresa, ou contratar um gestor de produto técnico.

Quando as empresas trazem uma função de gestão de produtos de alto nível, como um VP ou Diretor de Produto (sem comentar sobre a confusão de nomes de cargo no mercado), elas estão buscando transferir decisões estratégicas. O presidente ou fundador chega à conclusão de que está gastando muito tempo "dentro do negócio" em vez de "fazer o negócio".

Em certos cenários, pessoas que já estavam encarregadas da estratégia do produto ainda desejam continuar no controle dela. Isso significa que o novo líder de produto teria um papel mais gerencial ou técnico nesse caso. Daí vem os heads e GPMs por exemplo. Por que esse middle management seria o responsável por definir padrões, processos e estruturas para que a área possa escalar e ser eficiente do ponto de vista de rodagem.

Para alcançar tamanhos maiores, a padronização é a resposta. Um manual de produtos com uma linguagem unificada, artefatos específicos e funções definidas permitirá que a gestão de produtos transforme sistematicamente as melhores ideias em produtos prósperos.

Documentação é um assunto quase que 100% ignorado por líderes e PMs de produto. Talvez por que a maioria ache que seja uma tarefa burocrática. Mas isso é um erro. A documentação de produto, não apenas as de delivery (que explicam as motivações e as decisões das soluções priorizadas), mas as que criam e mantém uma cultura de produto coesa e saudável.

À medida que sua empresa se expande, ter esses padrões culturais de comportamento e atuação técnica, que ajuda a delimitar as funções e responsabilidades, facilita muito a adaptação de novos funcionários, potencializando uma escala saudável. E aí, é mais um ingrediente para estimular grandes demissões pela falta de eficiência e crescimento insustentável de times.

Estabeleça (ou mude) seus processos

Processos foram feitos para aumentar nossa eficiência. Geralmente, ser eficiente significa alcançar um objetivo de maneira rápida, precisa e com o mínimo de desperdício de recursos e energia. Ou seja: alta velocidade, alta qualidade, baixo esforço.

Se há um entendimento compartilhado entre os times e os líderes de que somos eficientes para acompanhar a velocidade de crescimento da empresa, ou até mesmo com algum espaço para aumentar essa velocidade, não é necessário criar processos.

Eu sou muito adepto de criar processos quando percebemos que a curva de eficiência pode estar em declínio, então, começar a estabelecer padrões e processos pode reverter essa tendência. Caso contrário, não precisamos adicionar processos além dos que já existem (mesmo se não existe nenhum ainda). Quanto menos processo melhor. Mas se houver processos, eles precisam ser medidos para termos certeza de que estamos sendo mais eficientes e eficazes.

Determine quais são essenciais e quais são desnecessários. Identifique as disparidades entre o que está em vigor agora e o que é desejado no futuro. Estabeleça as tarefas e artefatos para cada fase. Para cada ação, determine seu impacto no sucesso de seu negócio. Onde deve ser dada mais atenção? Quão bem-sucedida é a execução dessas atividades no momento?

Não adiante uma estrutura grande e complexa de governança de processos se não for estritamente necessário ou que não tenha fortes evidências de que isso possa trazer retorno rápido de entrega com resultado claro pro negócio.

Os processos ou a maneira do time atuar faz parte da cultura da área. Tome tempo para encontrar artefatos, métodos, frameworks e processos que tenham fit claro com a cultura global da empresa. Isso facilita muito a integração com outras áreas e principalmente cria oportunidades de influencia para outros times.

Não comece com um plano de carreira complexo. Prefira a evolução contínua

Incrível o quanto há empresas no mercado dizem: "nós ainda não temos um plano de carreira para a área, por causa do crescimento acelerado que tivemos". Planos de carreira, em geral, no início do seu desenvolvimento não são complexos e cheio de condicionais e níveis de cargos. Pelo contrário. Podemos começar simples e evoluir o plano de carreira assim como fazemos com outros pontos da empresa.

Claramente já temos exemplos suficientes no mercado para conseguir iniciar de uma base elevada de maturidade, sem a necessidade de planejar tudo do zero. Os líderes precisam estimar o ritmo de crescimento da empresa para gerar cenários de contratações. Eu entendo que isso pode ser utópico e que o sucesso pode vir numa velocidade avassaladora. Mas o quanto antes houver um plano de evolução de como a empresa vai tratar o plano de carreira das pessoas de tecnologia e produto, melhor é.

Outro ponto é deixar extremamente claro as atribuições, escopos e papéis de todas as funções. Eu sei que é óbvio, mas acredite, já vi empresas com 10-15 anos de idade criando do zero o plano de carreira da área, precisando criar uma área de RH exclusiva para a área de produtos e tecnologia, em momentos que os times não sabiam quais eram as atribuições e responsabilidades exatas dos seus líderes. Uma implementação mal feita de estrutura matricial pode causar mais confusão do que escala.

É tanta coisa para falar, que é melhor parar por agora

A integração bem-sucedida da gestão de produtos nas empresas requer tempo, esforço e compromisso contínuos. No entanto, os benefícios de uma gestão de produtos eficaz podem ser significativos, permitindo que as empresas desenvolvam e entreguem produtos de alta qualidade que atendam às necessidades de seus clientes e impulsionem o crescimento do negócio.

A área de produto é responsável por trazer resultado de negócio por meio do produto, fazendo seus usuários perceberem valor cada vez mais rápido. Eu duvido de qualquer outra atribuição da área de produtos que não seja essa.

Eu não falei sobre uma série de coisas aqui como:

  • Relação da área de produtos com outras áreas;
  • Relação da área de produtos com o mercado;
  • Como a área de estratégia influencia o time de produto;
  • Confusão e correria no planejamento dos ciclos de trabalho;
  • Criação da percepção de desconfiança e insegurança dos executivos pelo time de produto;
  • Percepção de falta de entrega ou ineficiência da área de produto;
  • Quando o foco não é mais produto;
  • Como encontrar o ponto ótimo onde o time de produto/tech deixa de crescer, mas a empresa continua crescendo pela entrega de resultados contínuos;

Se você parar para pensar, muitos dos problemas atuais de times de produto advém desses pontos. A velocidade não é nada sem controle. Mas controle não significa asfixiar a autonomia e o poder criativo das pessoas. Controle significa garantir que todos estão indo na mesma direção, em uma velocidade aceitável e sustentável. Essa garantia deveria vir dos líderes.